Traições e a corrida pela Presidência da Câmara


Se padrão de traições do passado se repetir, Arthur Lira terá ampla margem de votos sobre Baleia Rossi
POR FRANCISCO RICCI • 22/01/2021

No dia 2 de fevereiro, os deputados federais elegerão, sob voto secreto, um novo presidente da Câmara. Hoje, o deputado Arthur Lira (PP) tem o apoio do presidente Bolsonaro e de um bloco de 249 deputados — pouco menos que os 257 necessários para vencer. Já o deputado Baleia Rossi (MDB) é candidato de uma coalizão competitiva que inclui o PT, o PSDB e o DEM, somando 236 votos. No entanto, o padrão de traições na eleição para presidente da Câmara tende a favorecer Lira ainda mais do que seus números atuais indicam.

Lira conta hoje com apoio declarado do PSL, PL, PP, PSD, Republicanos, PTB, PROS, PSC, Avante e Patriota. Estes partidos somados renderiam 249 votos. Já seu adversário, o deputado Baleia Rossi, teria 236 votos assegurados pelo seu bloco, composto por PT, MDB, PSB, PSDB, DEM, PDT, Cidadania, PV, PCdoB, Rede e Solidariedade.

Contudo, a análise das últimas sete eleições para presidente da Câmara revela que a vantagem de Lira é ainda maior que esses números indicam. Ao comparar o tamanho dos blocos de partidos com os votos reais de cada candidato nessas eleições, o Pindograma estimou a oscilação na votação devida a traições. Calculamos que, desde 2007, cada candidato a presidente da Câmara perdeu ou ganhou, em média, 49 votos por conta de traições.

Este ano, tudo indica que Arthur Lira ganhará votos com as traições. Um levantamento do jornal O Estado de São Paulo perguntou a cada deputado o seu voto para presidente. Segundo o placar de 22 de janeiro, Lira conta com apoios de 20 parlamentares do DEM, PSDB, PSB, MDB e Solidariedade — todos partidos que formalmente apoiam Baleia Rossi. Já Baleia angariou somente cinco votos do bloco de seu adversário.

O deputado tem o apoio do governo de Jair Bolsonaro (sem partido), que procura assegurar um aliado no cargo para evitar que um processo de impedimento contra ele seja pautado. O governo cogita até recriar ministérios para ganhar votos e está explicitamente oferecendo cargos, vantagens e emendas para parlamentares que decidirem trair Baleia Rossi em favor de Lira.

Todos esses números apontam para um triunfo de Arthur Lira: a média histórica de traições e as traições já declaradas por deputados este ano apontam para uma vitória do deputado no primeiro turno. Além disso, dos 172 deputados que ainda não anunciaram seu voto, 55% são do bloco de Baleia Rossi — o que dá a Lira um espaço maior que o de seu adversário para virar votos.


Em 2011, o deputado Marco Maia (PT) tinha 469 deputados oficialmente em seu bloco, mas perdeu 94 deputados para o candidato Sandro Mabel (PR), candidato de protesto contra a candidatura apoiada pela maioria. Já em 2013, 135 deputados de partidos que apoiavam Henrique Eduardo Alves (PMDB) migraram para as candidaturas independentes de Rose de Freitas (PMDB) e Júlio Delgado (PSB).

Em casos de eleições onde um candidato tem a vitória quase garantida, como as de 2011 e 2013, os deputados podem se dar ao luxo de mandar uma mensagem à liderança sem consequências reais para o Congresso. Por isso, tendem a haver mais traições.

Mesmo assim, as traições ainda ocorrem nos pleitos mais competitivos. Em 2015, Eduardo Cunha (PMDB) derrotou o governista Arlindo Chinaglia (PT) em meio à enorme crise de popularidade do governo Dilma. Sem os 49 votos ganhos com traições do bloco de Chinaglia e de Júlio Delgado — coincidentemente, o mesmo número da média histórica de traições —, o peemedebista não teria sido eleito em primeiro turno.

Com a saída de Cunha em 2016, Rodrigo Maia (DEM) foi eleito para um mandato tampão e subsequentemente reeleito duas vezes. Os três pleitos em que concorreu seguiram o padrão de eleições pouco competitivas: em 2019, por exemplo, Maia perdeu 59 votos para traições, mas ainda venceu em primeiro turno com uma ampla vantagem de 334 votos. Nenhum outro candidato conseguiu mais de 66 votos.

De todas as eleições desde 2007, Eduardo Cunha foi o único candidato que derrotou um candidato apoiado pelo Palácio do Planalto. Pressão, votos e alianças ainda podem mudar a eleição deste ano até o último segundo.

Metodologia

A “traição” sofrida por cada candidato à presidência da Câmara foi calculada através da diferença entre o tamanho de seu bloco de apoio e os votos que obteve na no primeiro turno da eleição. A média histórica de traições é a média simples da “traição” de todos os candidatos desde 2007. Os blocos de apoio a candidatos à presidência da Câmara foram obtidos através de dados da Secretaria Geral da Mesa da Câmara e da imprensa. O tamanho das bancadas na Câmara no momento de cada eleição foi extraído do Diário da Câmara dos Deputados para os anos de 2009, 2013 e 2017; e do Tribunal Superior Eleitoral/Cepespdata para os anos de 2007, 2011, 2015 e 2019. A eleição especial de 2016 foi excluída, pois nela não foram registrados blocos de apoio.


Dados utilizados na matéria: Filiação partidária dos deputados (TSE/Cepespdata; Câmara dos Deputados); Blocos de apoio a candidatos para a Presidência da Câmara (Secretaria Geral da Mesa da Câmara dos Deputados).

Contribuiu com dados: Daniel Ferreira.

Créditos da imagem: Wilson Dias/Agência Brasil, Luis Macedo/Agência Câmara, Baleia Rossi/Divulgação.

Para reproduzir os números citados, o código e os dados podem ser encontrados aqui.

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Francisco Ricci é fundador e repórter do Pindograma.

Traições e a corrida pela Presidência da Câmara

Se padrão de traições do passado se repetir, Arthur Lira terá ampla margem de votos sobre Baleia Rossi

POR FRANCISCO RICCI

22/01/2021

No dia 2 de fevereiro, os deputados federais elegerão, sob voto secreto, um novo presidente da Câmara. Hoje, o deputado Arthur Lira (PP) tem o apoio do presidente Bolsonaro e de um bloco de 249 deputados — pouco menos que os 257 necessários para vencer. Já o deputado Baleia Rossi (MDB) é candidato de uma coalizão competitiva que inclui o PT, o PSDB e o DEM, somando 236 votos. No entanto, o padrão de traições na eleição para presidente da Câmara tende a favorecer Lira ainda mais do que seus números atuais indicam.

Lira conta hoje com apoio declarado do PSL, PL, PP, PSD, Republicanos, PTB, PROS, PSC, Avante e Patriota. Estes partidos somados renderiam 249 votos. Já seu adversário, o deputado Baleia Rossi, teria 236 votos assegurados pelo seu bloco, composto por PT, MDB, PSB, PSDB, DEM, PDT, Cidadania, PV, PCdoB, Rede e Solidariedade.

Contudo, a análise das últimas sete eleições para presidente da Câmara revela que a vantagem de Lira é ainda maior que esses números indicam. Ao comparar o tamanho dos blocos de partidos com os votos reais de cada candidato nessas eleições, o Pindograma estimou a oscilação na votação devida a traições. Calculamos que, desde 2007, cada candidato a presidente da Câmara perdeu ou ganhou, em média, 49 votos por conta de traições.

Este ano, tudo indica que Arthur Lira ganhará votos com as traições. Um levantamento do jornal O Estado de São Paulo perguntou a cada deputado o seu voto para presidente. Segundo o placar de 22 de janeiro, Lira conta com apoios de 20 parlamentares do DEM, PSDB, PSB, MDB e Solidariedade — todos partidos que formalmente apoiam Baleia Rossi. Já Baleia angariou somente cinco votos do bloco de seu adversário.

O deputado tem o apoio do governo de Jair Bolsonaro (sem partido), que procura assegurar um aliado no cargo para evitar que um processo de impedimento contra ele seja pautado. O governo cogita até recriar ministérios para ganhar votos e está explicitamente oferecendo cargos, vantagens e emendas para parlamentares que decidirem trair Baleia Rossi em favor de Lira.

Todos esses números apontam para um triunfo de Arthur Lira: a média histórica de traições e as traições já declaradas por deputados este ano apontam para uma vitória do deputado no primeiro turno. Além disso, dos 172 deputados que ainda não anunciaram seu voto, 55% são do bloco de Baleia Rossi — o que dá a Lira um espaço maior que o de seu adversário para virar votos.


Em 2011, o deputado Marco Maia (PT) tinha 469 deputados oficialmente em seu bloco, mas perdeu 94 deputados para o candidato Sandro Mabel (PR), candidato de protesto contra a candidatura apoiada pela maioria. Já em 2013, 135 deputados de partidos que apoiavam Henrique Eduardo Alves (PMDB) migraram para as candidaturas independentes de Rose de Freitas (PMDB) e Júlio Delgado (PSB).

Em casos de eleições onde um candidato tem a vitória quase garantida, como as de 2011 e 2013, os deputados podem se dar ao luxo de mandar uma mensagem à liderança sem consequências reais para o Congresso. Por isso, tendem a haver mais traições.

Mesmo assim, as traições ainda ocorrem nos pleitos mais competitivos. Em 2015, Eduardo Cunha (PMDB) derrotou o governista Arlindo Chinaglia (PT) em meio à enorme crise de popularidade do governo Dilma. Sem os 49 votos ganhos com traições do bloco de Chinaglia e de Júlio Delgado — coincidentemente, o mesmo número da média histórica de traições —, o peemedebista não teria sido eleito em primeiro turno.

Com a saída de Cunha em 2016, Rodrigo Maia (DEM) foi eleito para um mandato tampão e subsequentemente reeleito duas vezes. Os três pleitos em que concorreu seguiram o padrão de eleições pouco competitivas: em 2019, por exemplo, Maia perdeu 59 votos para traições, mas ainda venceu em primeiro turno com uma ampla vantagem de 334 votos. Nenhum outro candidato conseguiu mais de 66 votos.

De todas as eleições desde 2007, Eduardo Cunha foi o único candidato que derrotou um candidato apoiado pelo Palácio do Planalto. Pressão, votos e alianças ainda podem mudar a eleição deste ano até o último segundo.

Metodologia

A “traição” sofrida por cada candidato à presidência da Câmara foi calculada através da diferença entre o tamanho de seu bloco de apoio e os votos que obteve na no primeiro turno da eleição. A média histórica de traições é a média simples da “traição” de todos os candidatos desde 2007. Os blocos de apoio a candidatos à presidência da Câmara foram obtidos através de dados da Secretaria Geral da Mesa da Câmara e da imprensa. O tamanho das bancadas na Câmara no momento de cada eleição foi extraído do Diário da Câmara dos Deputados para os anos de 2009, 2013 e 2017; e do Tribunal Superior Eleitoral/Cepespdata para os anos de 2007, 2011, 2015 e 2019. A eleição especial de 2016 foi excluída, pois nela não foram registrados blocos de apoio.


Dados utilizados na matéria: Filiação partidária dos deputados (TSE/Cepespdata; Câmara dos Deputados); Blocos de apoio a candidatos para a Presidência da Câmara (Secretaria Geral da Mesa da Câmara dos Deputados).

Contribuiu com dados: Daniel Ferreira.

Créditos da imagem: Wilson Dias/Agência Brasil, Luis Macedo/Agência Câmara, Baleia Rossi/Divulgação.

Para reproduzir os números citados, o código e os dados podem ser encontrados aqui.

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