Quem está no centro da Roda?


Programa Roda Viva deu destaque a governistas sob Temer, porém está mais equilibrado sob Bolsonaro
POR FRANCISCO RICCI • 16/10/2020

O Roda Viva, o mais antigo programa de entrevistas na televisão brasileira ainda no ar, constantemente gera pautas no debate público. A entrevista do então candidato à presidência Jair Bolsonaro, por exemplo, acumula 10 milhões de visualizações no YouTube. Dessa forma, a escolha de quem colocar no centro da Roda é também a escolha do que colocar no centro da discussão pública naquela semana. Resta, então, perguntar: quem foram os convidados políticos escolhidos nos últimos mandatos presidenciais?

O Pindograma analisou todos os convidados atuantes na política partidária convidados desde 2012 e os classificamos entre favoráveis ao governo, opositores e figuras sem posição explícita, que chamaremos de ‘neutros’. Durante o governo Bolsonaro, por exemplo, Ricardo Salles foi classificado como favorável; Flávio Dino (PCdoB) como opositor; e Rodrigo Maia (DEM) como neutro.

O primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT) foi coberto pelo Roda Viva de forma bastante equilibrada. Como um todo, foram convidados 13 oposicionistas, 16 governistas e 1 entrevistado neutro para o centro da roda de entrevistas. Entre os políticos convidados que criticaram seu primeiro governo, 8 dos 13 eram membros do PSDB. Já entre os entrevistados que apoiavam a presidente, 8 dos 16 eram membros do PT. À época, foram convidados 3 ministros de estado.

No segundo mandato de Dilma, os críticos roubaram os holofotes. A crise política e econômica que levou ao impedimento da presidente moldou a cobertura do Roda Viva, que explorou principalmente convidados que a rejeitavam. Foram convidados 8 oposicionistas, 2 neutros e somente 4 defensores do governo –– todos ministros de estado à época. Já entre os 8 que trouxeram críticas, 3 eram ex-membros da base aliada que aderiram ao impedimento da presidente e outros 3 eram membros do PSDB.

Michel Temer (MDB) ultrapassou a grande impopularidade de Dilma. Ainda assim, o seu governo foi o que mais teve voz no programa desde 2012. Dos 37 convidados do programa, apenas 6 eram críticos ao governo. De resto, 8 eram neutros e 23 eram governistas. Os poucos políticos críticos vieram de diversos partidos de esquerda, como Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (REDE) e Manuela D’Ávila (PCdoB). Apenas dois petistas foram convidados ao programa: o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e Luiz Marinho, então candidato ao governo de São Paulo. Entre os muitos favoráveis a Temer, estavam 7 ministros de estado e 9 membros do PSDB, partido que passou a compor o governo.

Apesar de críticas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à imprensa, a cobertura do Roda Viva tem sido particularmente equilibrada durante o seu governo. Foram convidados 11 oposicionistas, 10 neutros e 11 governistas para o centro da roda de entrevistas. 7 dos 11 convidados favoráveis ao Governo Bolsonaro foram ministros, a maior proporção das administrações analisadas.

Mas são as vozes da oposição convidadas que configuram o fato mais único do governo de Bolsonaro. 5 dos 11 entrevistados de oposição foram crias do próprio presidente: Alexandre Frota (PSDB), expulso do PSL por ter deixado de apoiar o governo Jair Bolsonaro; Joice Hasselmann (PSL), já como desafeto do clã Bolsonaro; o então governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel (PSC) que rompera com o presidente; e os ex-ministros Gustavo Bebianno (PSL) e Luiz Henrique Mandetta (DEM).

Durante o período que analisamos, o Roda Viva foi comandado por Mário Sérgio Conti (2011-2013), Augusto Nunes (2013-2018), Ricardo Lessa (2018-2019), Daniela Lima (2019) e atualmente é apresentado por Vera Magalhães. Mas foi no período de Augusto Nunes no comando do programa que os desequilíbrios entre apoiadores e opositores chamaram a atenção. A grande quantidade de críticos a Dilma e apoiadores de Temer causou controvérsias que culminaram com a saída do jornalista do programa.

Em entrevista ao Estadão, Nunes afirmou que saiu do programa por ter sido pressionado a convidar mais representantes da esquerda. Criticou quem sustentava “que a programação da Cultura, sobretudo o Roda Viva, deve[ria] entrar no clima de Fla x Flu vigente na internet” e afirmou que era “preciso combater a radicalização dos confrontos políticos”. Sugeriu também à Folha de São Paulo que o conselho do Roda Viva impunha a ele a escolha de alguns convidados como “o ministro da Educação, o das Comunicações, o da Saúde”, o que poderia explicar o alto número de apoiadores do governo Temer.

Com a mudança de governo, o programa mudou. Recentemente, a apresentadora Vera Magalhães anunciou pelo Twitter que o Roda Viva terá mais um bloco de 15 minutos, graças à “maior audiência histórica”. A estratégia da jornalista de equilibrar convites a governistas e a ex-aliados do governo parece ter agradado ao público.


Dados utilizados na matéria: Lista de convidados do Roda Viva (Wikipedia/Pindograma); Lista de Deputados Eleitos (Tribunal Superior Eleitoral); Lista de Ministros de Estado (Portal da Transparência/CGU).

Contribuíram com dados: Antonio Piltcher e Daniel Ferreira.

Crédito da imagem: Governo do Estado de São Paulo.

Para reproduzir os números citados, os dados e o código podem ser encontrados aqui.

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Francisco Ricci é fundador e repórter do Pindograma.

Quem está no centro da Roda?

Programa Roda Viva deu destaque a governistas sob Temer, porém está mais equilibrado sob Bolsonaro

POR FRANCISCO RICCI

16/10/2020

O Roda Viva, o mais antigo programa de entrevistas na televisão brasileira ainda no ar, constantemente gera pautas no debate público. A entrevista do então candidato à presidência Jair Bolsonaro, por exemplo, acumula 10 milhões de visualizações no YouTube. Dessa forma, a escolha de quem colocar no centro da Roda é também a escolha do que colocar no centro da discussão pública naquela semana. Resta, então, perguntar: quem foram os convidados políticos escolhidos nos últimos mandatos presidenciais?

O Pindograma analisou todos os convidados atuantes na política partidária convidados desde 2012 e os classificamos entre favoráveis ao governo, opositores e figuras sem posição explícita, que chamaremos de ‘neutros’. Durante o governo Bolsonaro, por exemplo, Ricardo Salles foi classificado como favorável; Flávio Dino (PCdoB) como opositor; e Rodrigo Maia (DEM) como neutro.

O primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT) foi coberto pelo Roda Viva de forma bastante equilibrada. Como um todo, foram convidados 13 oposicionistas, 16 governistas e 1 entrevistado neutro para o centro da roda de entrevistas. Entre os políticos convidados que criticaram seu primeiro governo, 8 dos 13 eram membros do PSDB. Já entre os entrevistados que apoiavam a presidente, 8 dos 16 eram membros do PT. À época, foram convidados 3 ministros de estado.

No segundo mandato de Dilma, os críticos roubaram os holofotes. A crise política e econômica que levou ao impedimento da presidente moldou a cobertura do Roda Viva, que explorou principalmente convidados que a rejeitavam. Foram convidados 8 oposicionistas, 2 neutros e somente 4 defensores do governo –– todos ministros de estado à época. Já entre os 8 que trouxeram críticas, 3 eram ex-membros da base aliada que aderiram ao impedimento da presidente e outros 3 eram membros do PSDB.

Michel Temer (MDB) ultrapassou a grande impopularidade de Dilma. Ainda assim, o seu governo foi o que mais teve voz no programa desde 2012. Dos 37 convidados do programa, apenas 6 eram críticos ao governo. De resto, 8 eram neutros e 23 eram governistas. Os poucos políticos críticos vieram de diversos partidos de esquerda, como Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (REDE) e Manuela D’Ávila (PCdoB). Apenas dois petistas foram convidados ao programa: o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e Luiz Marinho, então candidato ao governo de São Paulo. Entre os muitos favoráveis a Temer, estavam 7 ministros de estado e 9 membros do PSDB, partido que passou a compor o governo.

Apesar de críticas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à imprensa, a cobertura do Roda Viva tem sido particularmente equilibrada durante o seu governo. Foram convidados 11 oposicionistas, 10 neutros e 11 governistas para o centro da roda de entrevistas. 7 dos 11 convidados favoráveis ao Governo Bolsonaro foram ministros, a maior proporção das administrações analisadas.

Mas são as vozes da oposição convidadas que configuram o fato mais único do governo de Bolsonaro. 5 dos 11 entrevistados de oposição foram crias do próprio presidente: Alexandre Frota (PSDB), expulso do PSL por ter deixado de apoiar o governo Jair Bolsonaro; Joice Hasselmann (PSL), já como desafeto do clã Bolsonaro; o então governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel (PSC) que rompera com o presidente; e os ex-ministros Gustavo Bebianno (PSL) e Luiz Henrique Mandetta (DEM).

Durante o período que analisamos, o Roda Viva foi comandado por Mário Sérgio Conti (2011-2013), Augusto Nunes (2013-2018), Ricardo Lessa (2018-2019), Daniela Lima (2019) e atualmente é apresentado por Vera Magalhães. Mas foi no período de Augusto Nunes no comando do programa que os desequilíbrios entre apoiadores e opositores chamaram a atenção. A grande quantidade de críticos a Dilma e apoiadores de Temer causou controvérsias que culminaram com a saída do jornalista do programa.

Em entrevista ao Estadão, Nunes afirmou que saiu do programa por ter sido pressionado a convidar mais representantes da esquerda. Criticou quem sustentava “que a programação da Cultura, sobretudo o Roda Viva, deve[ria] entrar no clima de Fla x Flu vigente na internet” e afirmou que era “preciso combater a radicalização dos confrontos políticos”. Sugeriu também à Folha de São Paulo que o conselho do Roda Viva impunha a ele a escolha de alguns convidados como “o ministro da Educação, o das Comunicações, o da Saúde”, o que poderia explicar o alto número de apoiadores do governo Temer.

Com a mudança de governo, o programa mudou. Recentemente, a apresentadora Vera Magalhães anunciou pelo Twitter que o Roda Viva terá mais um bloco de 15 minutos, graças à “maior audiência histórica”. A estratégia da jornalista de equilibrar convites a governistas e a ex-aliados do governo parece ter agradado ao público.


Dados utilizados na matéria: Lista de convidados do Roda Viva (Wikipedia/Pindograma); Lista de Deputados Eleitos (Tribunal Superior Eleitoral); Lista de Ministros de Estado (Portal da Transparência/CGU).

Contribuíram com dados: Antonio Piltcher e Daniel Ferreira.

Crédito da imagem: Governo do Estado de São Paulo.

Para reproduzir os números citados, os dados e o código podem ser encontrados aqui.

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Francisco Ricci

é fundador e repórter do Pindograma.

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